O livro de entrevistas Entrevozes Urbanas, organizado por Pedro Russi e Renata Almendra e lançado agora pela FAC Livros, quer ser uma janela para as conversas, fotografias e diálogos espontâneos. Experiências que fizeram e fazem parte de uma longa e interessante caminhada, tipo guarda-chuva, intitulada “Pichação e Graffiti, singularidades de Gênero como significação e reinterpretação do espaço urbano por Pichadoras-Graffiteiras”, com um olhar mais detido nas “Intervenções e Ressignificações Urbanas”, do grupo de Pesquisa e de Estudos coordenado pelo professor Pedro Russi da Faculdade de Comunicação, na esfera do Núcleo de Estudos de Semiótica em Comunicação (NESECOM), na Universidade de Brasília. As entrevistas, nesse contexto, foram realizadas por estudantes que integraram o grupo de pesquisa. Elas e eles cursaram distintas áreas de estudos dentro e fora da Universidade de Brasília, assim como em níveis de formação (graduação, mestrado, doutorado). Embora algumas e alguns não participaram realizando as entrevistas, estão presentes nas discussões prévias e posteriores. O cenário é de pesquisa, ou melhor, de inferências e abduções que procuram de maneira despenteada percorrer e abrir espaços, ou janelas, através das quais olhar para conhecer o que denominamos, de forma geral, como intervenções urbanas. Intervenções no sentido de intervir mesmo, de penetrar os muros/suportes, de ressignificar e propor outras leituras, quer dizer, reordenar constantemente para desmontar imediatamente o que está sendo disposto no espaço urbano-cidade. A cidade passa a ser “espaços outros”. As entrevistas e conversas revelam histórias de vida na experiência dessas intervenções urbanas, de diferentes pichadoras/es e grafiteiras/os que atuam no anonimato, também como ressignificação da cidade onde instalam diferentes esferas de ação (pichação, graffiti, música, estêncil, etc.). Pensamos nessas pessoas porque são conhecidas em Brasília e nas cidades satélites (especialmente) pelas suas obras-gestos, e não por serem renomados ou falados nos cenários midiáticos. Aqui o asfalto, as pedras, a terra, também se faz presente, sem pedir licença para pintar. Daí a articulação com a ideia de “anônimas/os”. Não queríamos entrevistar os clichês midiáticos. Optamos por aqueles que estão presentes de outra maneira, que se apresentam na circulação de sentidos a partir de outras estradas de atuação — as microfísicas, das migalhas —, que tecem e tricotam a cidades com outros fios. Para isso, é vital sair do circuito que a domesticação midiática e museologização vem “propondo” — impondo — às atuações urbanas. Domesticação que muito bem poderíamos denominar de intervencídio. O sentido das entrevistas aqui compartilhadas, realizadas pelos estudantes do grupo de pesquisa, está em posicionar neste tipo de circuito as vozes daqueles que estão propondo outras formas de sentir, ler e atuar na cidade. Resistimos porque saímos da dicotomia arte/não arte, lindo/feio, belo/feio etc, resistimos porque queremos compartilhar a escuta dessas outras vozes para que se expressem fora das domesticações do legal/ilegal, permitido/proibido. Eis o convite a reescrever, de intervir, de atuar nessas e a partir dessas conversas. O pincel, o spray, a tinta está, agora, nas suas mãos…

 

* Notícia republicada de https://faclivros.wordpress.com/2020/08/06/lancamento-fac-livros-entrevozes-urbanas/